Grilos e bichos
Hoje, eu matei um grilo. E me senti como uma assassina.
Estava lavando calçados, quando dentro de uma bota lá estava
o pequeno grilo. No susto, joguei a bota e o grilo na água. A bota sobreviveu.
O grilo também. Com medo de afogá-lo ou matá-lo com o sabão, tentei retirá-lo
da água. Mas ele se mostrou persistente escapando das minhas investidas com a
tampa do ralo. Até que, enfim, consegui colocá-lo na borda do tanque, onde o
pobrezinho se jogou num ataque suicida ao chão. Vi ele rastejar um pouco.
Imaginei que estivesse tudo bem, um pouco mais ele se secaria e estaria bem.
Fiquei observando aquela muda luta, quando movimento nenhum mais o bicho fez.
Observando sua perna em posição estranha, não achei que
estivesse morto, apenas descansando. Para me certificar, bati com um tênis
próximo ao animal esperando que ele fosse se mexer com o barulho. Sim, ele se
mexeu, mas foi com o vento que provoquei.
Pela primeira vez me senti como uma assassina. Na tentativa
de ajudar, matei. Pobre bichinho. Decidi devolvê-lo a natureza, onde ele ainda
poderia fazer algum bem. Enrolei-o num pedaço de pano arrancado da minha bota e
joguei-o na terra do lado de fora. Quem sabe, as formigas o comeriam. Mais adiante, vi aqueles protótipos de lesmas, pequenas
lesminhas que sempre surgiam em dia de chuva. Ah, que desgosto senti. Não
demorei muito e voltei com o pote de sal e um papel toalha para ajuntá-las do
chão. Sem remorso, joguei-as com sal e papel no lixo do banheiro.
Elis Regina, 2014.
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